segunda-feira, 27 de julho de 2009

Espanha a 50 euros por dia - Parte 1


Foto: Hemisfèric, na Cidade das Artes e da Ciência, em Valência. (Javier Yaya)

Se você gosta de presunto com marca, selo de origem e divisão por estrelas seu lugar é aqui.
A Espanha é plural. Consegue misturar num espaço único Pedro Almodóvar e Antoní Gaudí. Mesmo que você não admire nenhum dos dois, não se preocupe. Há outros loucos fazendo história no país. Ferrán Adrià, por exemplo. O badalado chef catalão brinca de fazer espuminha de abacate na chamada cozinha molecular.

Don Quixote e seus devaneios são fichinha perto do que se considera contemporâneo por estas paragens. A Espanha é moderna, progressista, mas cheia de tradições. Festejos populares reforçam todos os nossos padrões estabelecidos em relação à vida espanhola. Castanholas, toureiros, procissões e dança flamenca inundam as calles em dias de festa.

Depois de 30 anos de ditadura, o país se vê invariavelmente dividido entre arcaicas pelejas separatistas e arquitetura de ponta. Nem o pior atentado terrorista da história espanhola, em março de 2004 em Madri, freou a força e a gana de se superar. Uma viagem para cá deve ser feita em etapas. A Espanha é o terceiro maior país da Europa, um dos mais baratos do continente e - depois de Portugal - o mais transitável para um turista brasileiro (quando ele não é barrado na imigração).

No meio de tantas conquistas e reconquistas foi dominada durante 800 anos pelos mouros. Está entre tapas e cañas, ilhas com azul-turquesa-esverdeado-quase-transparente, areias negras e parques nacionais. Tem até um longo caminho - o de Santiago - para ser feito a pé, de carro ou de bicicleta. Vinho, sangria, tinto verano, ou xerez. Qualquer um deles servirá para embalar sua paella.

LA SIESTA E SEUS IDIOMAS

A siesta é o maior patrimônio zen-erudito-cultural da Espanha. É uma espécie de meditação ibérica que ocorre sempre depois do almoço e vai até umas cinco da tarde. Ou seja, depois de forrar a pança os espanhóis ficam em um estado sonolento – nem alfa, nem ômega – em que se dão o direito de dormir ou descansar por, pelo menos, uma horinha antes de voltar ao batente.

Nem todas as lojas e escritórios fecham no período de siesta como antigamente, mas é tão cultural tirar essa sonequinha no meio da tarde que boa parte do comércio baixa as portas das 14h às 17h. Os espanhóis adotaram esta tradição como uma forma prática de lidar com o calor intenso do verão europeu. Eu, como notívaga assumida, não perco por nada esse momento yoga-de-ser do espanhol.

O almoço também não é servido muito antes das 14h. Não se assuste se chegar a qualquer restaurante por volta do meio-dia e encontrar as portas fechadas. Para piorar – ou deixar mais excitante – a Espanha tem outros três idiomas oficiais: catalão (uma mistura de espanhol com francês), o galego (bem parecidinho com o português) e o euskara (só um estudioso de hieróglifos para decifrar).

Este último acho que é uma mistura de russo com alemão mais um dialeto próprio. Na verdade nunca sei. Mas sei que é impenetrável. Não existe diferença entre castelhano e español. É o mesmo idioma, o que muda são os regionalismos. Assim, como o português de Portugal e o português do Brasil.

O BARATO DA ESPANHA

MADRI - É a maior cidade do país. Possui dois dos principais museus da Europa, o Prado (com um dos mais importantes acervos do mundo em obras notáveis como As Meninas, de Velázquez) e o Reina Sofía. No primeiro, o ingresso são 6 euros, com entrada grátis aos domingos. O Reina Sofía - onde está a obra Guernica de Picasso - também cobra 6 euros, mas é gratuito no sábado à tarde e no domingo pela manhã. A Puerta del Sol é seu ponto de partida para caminhadas. É uma enorme área comercial com bom acesso ao transporte público. Mas a partir dela é possível conhecer, a pé, boa parte das atrações da cidade. Aqui tire sua foto cartão-postal ao lado da mais famosa estátua da cidade: el oso y el madroño. Circule pela Gran Via - uma das principais avenidas da capital. No número 72 está uma das unidades do Museu del Jamón. Uma mistura de restaurante e mercearia. Não paga nada para entrar, tem sempre um pratinho de degustação e você vai conhecer a maior variedade possível de presunto, ops, jamón que existe. Nas manhãs de domingo há o fervilhante mercado de pulgas El Rastro para investir boa parte do seu dia sem culpa. Já na Plaza Mayor - ex palco da inquisição e touradas - sinta-se em casa. Ponto de encontro de viajantes e madrilenhos. Site da cidade: www.esmadrid.org

BARCELONA - A maior herança do arquiteto Antoni Gaudi, o Parc Güell, é de graça. Um emaranhado de curvas que se misturam com caquinhos de azulejos. Desenhos que formam os mais belos mosaicos da arte contemporânea. Na igreja Sagrada Família (também de Gaudí) - um grande castelo de areia construído no meio da cidade - paga para entrar. Mas é do lado de fora, com uma certa distância, que se vê a inusitada e conflitante arquitetura. Sem falar no La Rambla - o principal calçadão da cidade - e o Bairro Gótico para se perder e andar, que é sempre grátis e desbravador. O Barcelona Card dá direito a transporte público ilimitado, entrada gratuita em vários museus e descontos em restaurantes. São 26 euros por dois dias ou 30 euros por três dias. Analise atentamente o que pretende fazer na cidade para saber se vale a pena ou não comprar um desses. Site da cidade: www.barcelonaturisme.com.

VALÊNCIA - É a expressão máxima da arquitetura futurista e foi cenário do mais recente filme de Almodóvar. Valência - da paella valenciana - abriga a Cidade das Artes e da Ciência, um complexo extraordinário que engloba museu, planetário e o maior aquário da Europa. O local, antes degradado, se transformou na região mais badalada da cidade. Foi um levante para disputar os visitantes com Sevilha - totalmente regenerada depois da Exposição Universal de 1992. O ingresso para conhecer o Hemisfèric (um edifício com teto ovóide com mais de 100 metros de longitude especialmente criado para projeções) e o Museu das Ciências custa 11,20 euros. Apesar do preço não ser, assim, tão econômico para o nosso modelo de viagem 5.0, é o maior barato de Valência. Site da cidade: www.turisvalencia.es

SEVILHA - Moura, dourada e às margens de um rio de nome complicado, o Guadalquivir, a cidade traz em cada esquina sete séculos de domínio árabe. A catedral gótica - que já foi mesquita - é uma das maiores construções cristãs. É daquele tipo de monumento em que se paga para entrar (7,50 euros), mas que do lado de fora (gratuito para babar) rendem muitos mais "oóóóhhhhhs" do que lá dentro. A Torre del Oro, entrada a 2 euros e gratuita às terças-feiras, foi erguida pelos árabes. Originariamente era uma das torres que integravam o muro fortificado de Sevilha. Sua construção é do século 13. É hoje a sede do Museu Naval. No bairro de Santa Cruz, um antigo quarteirão judeu, o passeio é perder-se. Nada restou da antiga comunidade judaica. Tudo aqui lembra castanhola, tapas e tablaos. Site da cidade: www.turismosevilla.org

GRANADA - Fique de joelhos. Em Granada está um dos monumentos mais visitados da Europa, o Alhambra. Uma fortaleza que envolve um rico complexo palaciano que inclui o Alcazaba (o forte), o Alcázar (o palácio), o Generalife (os jardins) e a grande muralha. Exibe os mais famosos elementos da arquitectura islâmica no país. Ingresso a 12 euros. Vá, nem que for para depois comer McDonald's três dias. O Alhambra restringe o número de pessoas por dia. Chegue cedo ou compre seu ingresso pela internet (www.alhambra-tickets.es). A reserva on-line custa 1 euro a mais. Será sua melhor economia na cidade: não perde-se tempo. Site: www.granada.tur


Foto: Mesquita de Córdoba. (Divulgação)


CÓRDOBA - A 2h de Madri pelo trem AVE, Córdoba tem um centrinho histórico pequeno e fácil de ser derriçado. O ônibus nº 03 para nas estações de trem e ônibus e vai até à Plaza Tendillas, perto da mesquita - o principal atrativo da cidade. A Mesquita de Córdoba já foi o maior templo do mundo islâmico. É uma mistura dos estilos bizantino e gótico e converteu-se em uma das mais imponentes construções da Espanha. Para entrar paga-se 8 euros. Mas durante as missas - todos os dias, às 8h30 e às 10h - a entrada é gratuita. Por ali está o Alcázar de los Reyes Cristianos, construído no século 14. Já foi sede da inquisição espanhola e residência dos reis católicos Fernando e Isabel. Aqui, recepcionaram Cristóvão Colombo antes da partida para a descoberta do novo mundo. Entrada a 4 euros. Gratuito às sextas-feiras. Site da cidade: www.turismodecordoba.org

BILBAO - Se eu fosse você pegaria um vôo low cost a partir de Madri ou Barcelona e desceria em Bilbao só para ver o Museu Guggenheim. Um bate-volta que vai ter lá seu custo. Mas a experiência na volta, não tem preço. Site da cidade: www.visitbilbao.info

ILHAS CANÁRIAS - Todos os guias falam com o maior empenho das Baleares. Mas muitas vezes se esquecem das Canárias, o arquipélago espanhol ubicado a pouco mais de 100 quilômetros do Marrocos e território mais próximo da Madeira, as ilhas portuguesas. A falar de viagem econômica, Lanzarote, Tenerife e Las Palmas são o paraíso na terra. Saramago escolheu a primeira para viver. Em Tenerife há a maior montanha da Espanha, o vulcão Teide. E em Las Palmas (fiz metrado aqui lá lá lá lá!), corra para o bairro de Vegueta – o quarteirão mais antigo da cidade. declarado Patrimônio Mundial. Em qualquer uma delas tem praia - com direito a escolher cor de areia,  cascalho e balanço do mar - sempre de graça. Site oficial: www.turismodecanarias.com

PARA FUGIR DO ÓBVIO

Num raio de 200 quilômetros de Madri estão cinco cidades Patrimônio Histórico da Humanidade. Toledo, Segóvia, Ávila, Cuenca e Salamanca. A medieval Toledo - às margens do Rio Tejo - por exemplo, está a 60 km – a meia hora de trem. Não pegue excursão. Na estação Atocha dá para comprar os bilhetes por 6 euros, ida e volta. A Santa Catedral Primada de Toledo demorou 250 anos para ficar pronta e a sacristia abriga obras de El Greco e Tristán. Entrada gratuita antes das 12h, depois das 16h e aos domingos. Fora disso, o ingresso custa 5 euros. Já Segóvia, a 1h30 
30 minutos de Madri com o trem rápido, merece um dia inteiro de visita. A cidade preserva o mais alto aqueduto do Império Romano, com 29 metros de altura. Entre no site oficial da Renfe para saber informações e horários dos trens.

SEM MARCAR TOUCA

Quem está acostumado a viajar de carona, fique atento: nas autopistas espanholas é ilegal dar o dedão.

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10 comentários:

  1. Em Barcelona, para quem leu o livro 'Catedral do Mar' (do Ildefonso Falcones), uma dica é a Església de Santa Maria del Mar (que é a própria Catedral do Mar). Mas é preciso se informar dos horários de abertura, que sao um pouco malucos.
    O bairro onde a igreja fica também é muito legal, eu adoro caminhar por aquela área :o)
    Beijos, Angie

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  2. Quem for para Andaluzia acho que vale a pena dar uma passada em Ronda. O cidadezinha interessante com as construções a beira do abismo.

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  3. ANGIE: não conheci esta igreja! Vou me informar! Mais uma das suas super dicas! Bjs, querida!

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  4. NEIDE: Ronda está nas nossas + 15 dicas da Espanha, que eu publico amanhã. O Parador da cidade é um momento exravagância que vale a pena e a condição geográfica da cidade... huuummm, sensacional! :-)

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  5. Ai Jesusss! Aqui eu tenho medo de me perder! rs...nos comentários, posso me tornar "muy pesada"...rsrs.
    Mas, queria compartilhar com você Silvia e com todos. Na região de Cantábria, existem umas cidadezinhas incríveis na minha opinião. Entre elas: Santillana del Mar, San Vicente de la barquera. Eu jamais perdi da memória as cenas bucólicas frente ao mar que só se observa naquelas costas. Desde os picos de Europa, então, o visual é incrível. Quem puder esticar até Cantábria, vale muito a pena.

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  6. Sílvia, mais um excelente post!
    Só uma atualização: agora com o trem rápido é possível ir de Madri para Segóvia em apenas 30 minutos (igual a Toledo) e para Ávila em 1h30. Ficou ainda melhor!

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  7. ALESSANDRO, muchísimas gracias! E eu ainda me esqueci de colocar o site da Renfe (Red Nacional de Ferrocarriles Españoles- hehehe, adoro esse nome). Assim que puder vou atualizar o post! Abs!

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  8. Ai, ai (suspiro de saudades) NAIR... Santillana del Mar!!! Está nos nosso 15+! :-)

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  9. Parabens pela serie, muito legal, e otima fonte de dicas para quem nao conheçe!

    Ernesto

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  10. Ernesto, imagino que a proposta da série é essa mesmo, para quem nunca esteve lá e conhece pouco do universo europeu. E claro, quer gastar pouco!!! Mas até quem já esteve vai sempre encontrar aqui uma ou outra diquinha para quando quiser voltar! :-)

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